História da península ibérica
De acordo com o Mapa , podem ser notados os diferentes
povos que habitaram a Península Ibérica antes da colonização do Império Romano
e que devem ter contribuído decididamente com o substrato local na origem do
processo de formação das línguas atuais. Por exemplo, nota-se que a região que
foi o berço do galego português era, no período pré-romano, ocupada pelos povos
galaicos e lusitanos que ali deixaram um substrato característico de seus
falares como herança linguística.
No ano de 210 a.
C., iniciou-se a colonização da Península Ibérica como empreendimento da
expansão do Império Romano, que inicialmente, conforme o Mapa 2, nota-se que se
deteve no litoral mediterrâneo principalmente visando a estabelecer o domínio
de cidades de colonização grega e fenícia. Posteriormente, de 197 a 133 a. C.,
durante o Império de Augusto, houve uma grande investida em direção ao interior
da Península com sua quase total incorporação ao Império, ficando apenas o
extremo norte povoado pelos bascos e cântabros, e extremo noroeste, povoado
pelos galaicos à margem imperial. Segundo Bassetto (2001, p. 102), somente em
19 d.C. os povos do norte e noroeste foram romanizados, ainda que Estrabão, em
sua Geografia (29 a. C.), afirme que estes povos caracterizavam-se pela
“brutalidade e selvageria”.
Durante o processo de romanização, foram introduzidos
vários elementos socioculturais desconhecidos pelos povos autóctones, tais
como: o direito romano; a língua latina (processo de latinização); a
organização militar, civil e política; que foram assimilados pelos povos
autóctones da Península conforme a estratégia de colonização aplicada a cada
localidade, visando à manutenção e integridade do Império.
Como reflexo dessa romanização, nota-se no Mapa , que na
evolução da divisão política, a região dos povos galaicos foi a de último
interesse para o Império Romano. No ano 287, a Gallaecia, província do Império
de Dioclesiano, foi descrita por geógrafos e historiadores como os territórios
compreendidos desde o Mar Cantábrico até o rio Douro e, desde Finisterris até a
Cantábria. Suas principais cidades eram Brigantium, atual cidade de A Corunha;
Lucus Augusti, atual cidade de Lugo; Braccara Augusta, atual cidade de Braga e
Portucale, atual cidade do Porto.
Segundo Monteagudo os factores fundamentais que contribuíram
para a latinização da região noroeste da península foram: a reorganização
político administrativa com a demarcação do território, que afetou
principalmente as elites locais; o exército romano, que afetou diretamente os
falares das classes mais baixas; a política de concessão de direitos e de
cidadania romana; a criação e o crescimento das cidades; a exploração mineira;
a escola de Braga; a rede viária que facilitou a mobilidade territorial e
possibilitou a integração da Gallaecia ao resto da prefeitura de Hispania,
promovendo também a intensificação das atividades comerciais e a imigração de
latinos falantes em direção à região.
É interessante notar que, se por um lado, a mobilidade no
território promoveu uma grande variedade linguística, por outro lado se apoiou
no uso do latim como língua franca. Segundo Monteagudo (1999, p. 56), em termos
sociolinguísticos, a diglossia proveniente da latinização acabou desencadeando
um processo massivo de assimilação linguística, que culminou com a extinção das
línguas autóctones na parte ocidental do Império.
Dessa maneira, o latim se sobrepôs às línguas locais e
distintas em épocas diferentes na Península Ibérica, significando que, durante
a romanização, nunca deve ter havido uma unidade linguística total na região peninsular.
Também, convém notar que os distintos povos conquistados ao adotar o latim,
devem ter passado a pronunciá-lo com seus próprios hábitos articulatórios e a
incorporar ao seu léxico palavras autóctones, formando variedades dialetais
características. Com a construção das vias romanas, foi estimulada a maior
interação entre os povos, propiciando as mais variadas interferências
linguísticas, além do contato permanente com Roma e suas variantes do latim.
Segundo Bassetto (2001, p. 110):
A norma vulgar foi preponderante no processo de difusão e
fixação do latim nas províncias, uma vez que era falada pelo exército, pelos
colonos civis e militares e pelos comerciantes – que mantinham contato direto e
permanente com as populações autóctones.
Assim, a
Gallaecia, uma das últimas regiões a ser romanizada na Península, já moldava
suas características, como fruto sociolinguístico, na assimilação do latim.
Com o enfraquecimento do Império Romano no final do
século IV, segundo Bassetto começaram as grandes migrações de povos não romanos
que duraram quase dois séculos.
Os vândalos, povos germânicos orientais e
linguisticamente ligados ao gótico, estavam divididos em: ásdingos e sílingos;
que, como aliados dos suevos (povos germânicos ocidentais) e dos alanos (de
origem indo-iraniana), chegaram à Península Ibérica.
Os
suevos e ásdingos seguiram para a região da Gallaecia, os alanos (povos não
germânicos) para a Lusitânia, e os sílingos para a Bética.
Posteriormente chegaram os visigodos à Península,
originários do sul da Escandinávia, que dizimaram os sílingos na Bética e
perseguiram os alanos e ásdingos, obrigando-os a se fixarem na região de
Vandalusia, “terra dos vândalos” (atual Andaluzia).
De acordo com
Mariño Paz os povos ásdingos (vândalos), que inicialmente se fixaram na
Gallaecia juntamente com os suevos em 411, se deslocaram da na região entre o
rio Douro e Tejo, já em 419, para o sul da Bética e, posteriormente para o
norte da África, sendo perseguidos pelos visigodos da Península e pelas
milícias do Império Bizantino. Assim, em 534, a região de Vandalusia foi tomada
pelo Império Bizantino de acordo com o empreendimento militar de destruir o
reino vândalo, conforme o ilustrado no Mapa .
Segundo Monteagudo , os suevos, pouco
romanizados e, inicialmente, não cristãos, seriam os responsáveis por dar
início ao particularismo da língua galego-portuguesa, ao se instalarem na
Gallaecia no início do século V, em 411
A fusão dos povos galaicos-romanos e suevos, foi um
processo prolongado que parece somente ter se estabilizado em 559 com a
conversão destes ao catolicismo. Seu reino ocupou desde a região norte do rio
Tejo e toda a província da Gallaecia com a capital em Braga, mas sucumbiu em
585 com as campanhas de expansão do reino visigodo de Leovigildo, que em 618 já
dominava quase toda a Península Ibérica, conforme o exposto no Mapa.
Para Mariño Paz , o fato de a Gallaecia permanecer
durante um século e meio, ou mesmo durante os três séculos da ocupação
germânica, praticamente isolada do resto da Península, favoreceu tendências de
desenvolvimento que já viriam da época romana e que naquele momento encontraram
uma realidade sociopolítica que as alimentou.
Entretanto, segundo Bassetto a superposição dos visigodos
aos suevos tornou difícil distinguir as influências específicas do superstrato
suevo. A formação dos reinos germânicos, segundo Wartburg rompendo os limites
do Império, influiu decididamente na formação dos espaços linguísticos
românicos, ao quebrar as linhas de comunicação com as diversas partes
imperiais.
No caso da
Hispânia, os suevos e visigodos, segundo Teyssier “tiveram um papel particularmente negativo:
com eles a unidade romana rompe-se definitivamente e as forças centrífugas vão
ponderar sobre as de coesão.” Não obstante, segundo Mariño Paz o analfabetismo
dos povos germânicos contrastava fortemente com a tradição romana, além disso,
a cristianização destes povos e a grande importância política adquirida pela
Igreja Católica entre os visigodos durante os séculos VI e VII, foram os
principais fatores que levaram o latim a se consolidar como língua na Península
Ibérica, mesmo diante das línguas dos povos dominantes.
De acordo com Bassetto no século VI, iniciou-se uma grande expansão dos domínios árabes impulsionada,
principalmente pela incipiente religião Islâmica. Após a morte de Maomé, em
632, com a Guerra Santa, em dois anos a expansão, encabeçada pelo Califa Abū
Bakr, estendeu –se por toda a Península Arábica. Com o Califa Omar, o Império
Árabe tornou-se uma teocracia com administração militar, na qual o comandante
militar era também o governador civil, chefe religioso e juiz supremo. Em 645,
o Império Árabe já dominara a Síria, a Palestina, o Egito e a Líbia, e, em 698,
também toda a África do Norte, conforme ilustração do Mapa .
Dessa forma, pouco mais de cem anos foi o tempo bastante
para que os árabes tivessem conseguido estender sua religião e língua bem como
seu domínio político em um imenso espaço que ia desde o Oceano Índico ao
Atlântico. Segundo Saraiva os fatores que explicaram essa rapidez foram a
fraqueza dos impérios vizinhos: Império Persa e Império Bizantino, as ferozes
lutas religiosas que então se travavam no Oriente Próximo, entre judeus e
cristãos e a situação das populações oprimidas das áreas conquistadas, que em
várias regiões, como por exemplo, no Norte da África e toda Península Arábica,
os acolheram como libertadores.
Devido à rapidez da conquista e facilitada pelo traçado
das vias romanas, em 711, a expansão do Império Árabe já se iniciava na
Península Ibérica, com as conquistas de Tārik e Mūsā, durante a dinastia dos
Omíadas. Segundo Bassetto no ano seguinte, Tārik já conseguira a conquista de
Toledo, e em 732, quando já conquistara quase toda a Península, foi derrotado
na batalha de Poitiers pelos Francos, conforme Mapa .
De acordo com Saraiva também a atitude dos povos
visigodos da Península favoreceu o seu rápido domínio, pois a situação das
populações perante o domínio árabe dependia da atitude que assumiam diante da
nova religião: se a aceitavam, faziam parte da comunidade; se continuavam fiéis
ao cristianismo, podiam manter suas propriedades, mas eram obrigadas a pagar
tributos; se resistiam com armas eram aniquiladas. Portanto a resistência
armada não foi o caso mais geral, afinal os tributos teriam que ser pagos quer
o senhor fosse cristão, quer islâmico.
Assim, segundo
Bassetto, foi a religião o factor fundamental de distanciamento entre as
populações árabes e românicas, concluindo-se que também foi um fator de
distanciamento entre as línguas latinas e arábicas. No entanto, nesse período,
a população visigoda dividiu-se em: moçárabes, que permaneceram cristãos, e
muladis, que se converteram ao islamismo, mas continuaram com a língua romance.
Durante o período de conquistas, os árabes ampliaram seu
conhecimento através da absorção das culturas de outros povos, levando-as
adiante a cada nova conquista e espalhando-o por seus territórios. A cultura
árabe caracterizou-se pela construção de palácios e mesquitas com seus jardins
exuberantes. Destacam-se, nestas construções, os arabescos para ilustração e
decoração, nos quais houve o emprego e a disseminação da geometria e álgebra
aplicadas.
A literatura
também teve um grande valor, com obras até hoje conhecidas no Ocidente, tais
como: As mil e uma noites, As minas do rei Salomão e Ali Babá e os Quarenta
ladrões. Especificamente na Península Ibérica, assim como o Império Romano
floresceu na Bética, também o Império Árabe floresceu ao sul da península.
Sevilha foi um grande centro irradiador de sua cultura, principalmente durante
o século XI e XII, ali se desenvolveram a medicina, filosofia, direito,
história, astronomia, teologia e as letras, com grande destaque à poesia. Como
personalidades importantes culturalmente desse período, destacam-se Averróis
(1126-1198) e Maimônides (1135-1204). Ainda que a cultura árabe, com sua
técnica e ciência, tenha sido muito mais refinada e, sob determinados aspectos,
muito mais desenvolvida que a dos povos românicos ali instalados, é curioso
notar que a língua dos dominadores não se sobrepôs à dos dominados.
É interessante notar também que a duração do domínio
árabe variou muito de região para região na Península Ibérica. Nunca chegou a
ser exercido nas terras mais setentrionais, pois ao norte do Rio Ebro já
retornara ao domínio cristão em 809. O
Porto e Braga foram conquistadas pelos cristãos em 868, Coimbra em 1064 e
Lisboa em 1147.
Já Sevilha, Córdoba e Faro fizeram parte do Império Árabe
durante cerca de seis séculos e Granada somente deixou de fazer parte deste
domínio no final do século XV. Apesar do grande legado linguístico deixado
pelos árabes, principalmente no castelhano, segundo Saraiva as variações do
domínio árabe em cada região repercutiram diretamente na intensidade da
influência da cultura árabe sobre as populações peninsulares, mas foi limitada
na linguagem: não deixando vestígios na sintaxe e no léxico contribuindo com
cerca de oitocentos vocábulos.
Segundo Barraclough & Parker durante o Império Árabe
também houve invasões na Península Ibérica de normandos (“homens do norte”),
povos provenientes da Escandinávia, guerreiros-marinheiros que entre o século
VIII e o século XI pilharam, invadiram e colonizaram as costas da Europa e
ilhas Britânicas.
Estes povos, que manejavam muito bem as embarcações à
vela, marcaram sua presença nas costas do Atlântico e, posteriormente, do
Mediterrâneo. Embora sejam conhecidos principalmente como disseminadores da
destruição, fundaram povoados e fizeram comércio pacificamente. Entretanto, em
844, costeando a Península Ibérica, desde o Cantábrico até o Mediterrâneo,
saquearam Gijón, A Corunha, Lisboa, Beja, o Algarve, Cádiz e Sevilha.
Posteriormente, em 859, atacaram Valência, as Ilhas Baleares e Barcelona.
Porém, parecem ter deixado poucas influências linguísticas em seu rastro pela
Península.
Segundo Saraiva o que realmente teve impacto marcante na
formação das atuais línguas da Península Ibérica foi o processo de reconquista
dos territórios peninsulares por pelos cristãos, cujo início é a ruptura do
Império Árabe, seu enfraquecimento político após a crise dos Omíadas, bem como
a distância entre al-Andalus e o centro do Império na Península Arábica, além
do desinteresse dos árabes pelo norte ibérico.
Em 756, de acordo com Barraclough & Parker Abd
ar-Rahmān, o único sobrevivente dos Omíadas da revolução árabe que levou os
Abássidas ao poder do Império, fugiu da Península Arábica e, ao chegar a
al-Andalus, proclamou ali sua independência com a capital em Córdoba,
tornando-se o novo califa da região. Abd ar-Rahmān I, reestruturou o seu regime
monárquico, baseado nas anteriores monarquias visigodas, como também
reestruturou as instituições administrativas e fiscais adaptando-as à realidade
social da região.
No século VIII,
Al-Hakam (796-822) conseguiu reestruturar o exército de al-Andalus, entre
outras coisas, por meio de incentivos e da manutenção de um salário permanente,
com o qual pode conter diversas revoltas internas e enfrentar o primeiro ataque
forte dos povos cristãos do norte provenientes do reino de Astúrias de Alfonso
II.
Nas primeiras décadas do século IX, o governo de Abd
ar-Rahmān II, centralizado em Córdoba, promoveu uma melhoria nas condições
sociais das populações andaluzas e introduziu algumas regalias aos muladis,
incentivando a conversão religiosa ao Islamismo. Entretanto, a partir da
segunda metade do século IX, começou a ocorrer uma grande crise política com a
revolta de várias regiões que estavam submetidas ao poder central do emirado de
Córdoba, conforme o Mapa 8. Além disso, nesse período também ocorrem revoltas e
descontentamentos da população moçárabe e cristã, devido ao processo de
hegemonia árabe, a “arabização” cultural que deixava à margem social os não
muçulmanos, aliada a bérberes e muladis irritados com as diferenças a favor dos
árabes e sírios.
Durante o governo de Abd ar-Rahmān III (912-961), o
território de al-Andalus, principalmente a partir de 914, passou a sofrer com
as intensas ofensivas dos reinos cristãos do norte da Península Ibérica, que já
se organizavam ao redor de sua capital León; bem como, em menor medida, dos
Condados Catalães. Com o fortalecimento de seu exército sob um regime
repressivo, Córdoba conseguiu o apogeu político durante o século X, passando de
Emirado a Califato, conseguido com o prestígio dos generais Galib, Al-Mansūr e
Abd al-Mālik; e com as diretrizes governamentais de Abd ar-Rahmān III, seguidas
por seus sucessores Omeídas: Al-Hakam II (961-976) e Hisām II (976-1009).
Durante o século X, houve um grande desenvolvimento das
cidades e do comércio provocando um auge cultural que continuou por boa parte
do século XI, alterando a base da economia e produzindo uma mudança social. Os
moçárabes perderam força e diminuíram em número e passaram a aceitar a língua e
cultura árabes. No âmbito político, que não mais se respaldava no exército já
enfraquecido, o território foi dividido em reinos Taifas, cujos governadores
eram supostos representantes do poder central de Córdoba. Alguns reinos foram
governados por dinastias bérberes, outros por muladis ou por árabes já
integrados na sociedade autóctone. Os Reinos importantes absorviam os menores,
principalmente na fronteira com os cristãos, e ao sul, destacavam-se o Reino
Taifa de Sevilha com governo andaluz e o de Granada sob o governo bérbere dos
zíries, conforme o Mapa .
Com o estabelecimento da segregação dos territórios
cristãos e muçulmanos, os Taifas fronteiriços passaram a pagar impostos aos
Reinos Cristãos, que aumentavam sua pressão militar e tributária. Em 1085, os
cristãos conquistaram a cidade de Toledo, como consequência, os reinos Taifas
aliaram-se militarmente aos almorávidas de Magribi, que passaram da condição de
aliados à de donos do poder político. A entrada dos almorávidas
norte-africanos, suas vitórias sobre os cristãos e seu domínio político em
al-Andalus, frearam, por algum tempo, a expansão do processo de reconquista.
.
Entretanto, no
início do século XII, com a intransigência, houve a perseguição e a expulsão
das minorias não muçulmanas, principalmente moçárabes e judias, que passaram a
se fixar em território cristão. Pouco depois, iniciou-se a decadência e as
divisões internas, o que permitiu aos cristãos a retomada e o sucesso do seu
empreendimento de expansão: a Reconquista.
Segundo Bassetto (2001, p. 150), no contexto da
reconquista situa-se a origem de Portugal. Sabe-se que os árabes não foram além
dos Montes Cantábricos, ao norte dos quais, inicial sob o comando de Pelaio,
foi-se formando uma região independente de cristãos que, em 718, veio a ser o
reino de Astúrias. Com Afonso I, rei de Astúrias, e suas guerras na Galiza
contra os muçulmanos, o Rio Douro foi uma das fronteiras entre cristãos e árabes,
conforme o Mapa.
De acordo com Alexandre Herculano, apud Saraiva (1999:
39-40), Afonso I reconquistou uma enorme região que incluía toda a Galiza, o
Minho, o Douro e parte da atual Beira Alta, “passando os mouros a fio de espada”.
Entretanto, para Saraiva a guerra não era religiosa, já que os muçulmanos
permitiam outras religiões, mas para apoderar-se das terras por meio das
colonizações.
Dessa forma, nasciam poderes representados por chefes
locais entre os quais se estabelecia uma hierarquia nem sempre bem definida,
intercalada de episódios de submissão e de rebeldia. Alguns nobres governavam
terras por nomeação dos reis, outros por as terem ocupado; na tradição da
nobreza ibérica ficaram vestígios dessa nobreza que entendia nada dever aos
reis. Seus títulos eram de condes e se caracterizavam por ser um misto de
proprietários, guerreiros, governadores e salteadores. Faziam a guerra quando
os reis os chamavam, mas não faltam exemplos de guerras entre si ou contra os
reis e até contra cristãos, conforme Saraiva .
As colonizações deram origem ao processo de
regionalização peninsular. Iniciaram-se na região galega e organizaram Estados
independentes que se aproveitaram do enfraquecimento do Império Árabe no século
IX para impulsionar a expansão cristã com a Reconquista de Leste a Oeste, bem
como em direção ao Sul, conforme o Mapa.
De acordo com Saraiva os novos países cristãos da
península formaram-se a partir de três núcleos distintos: o asturiano, que veio
a originar o reino de Oviedo, de Galiza e depois de Leão e Galiza e o condado
de Castela, independente durante alguns anos, depois transformado em reino e
que desde 1037 andou unido ao de Leão; o pirenaico, de onde saíram os reinos de
Pamplona e depois Navarra, o condado de Aragão, que logo se tornou reino,
alguns condados mais ou menos independentes; e o catalão com o condado de
Barcelona, onde os francos tiveram um papel importante.
No Mapa, que ilustra os territórios de Sancho III,
pode-se notar claramente os três núcleos: o reino de Galiza e Leão, e o condado
de Castela que representam o núcleo asturiano; o reino de Pamplona, os condados
de Aragão, Sobrarbe e Ribagorza que representam o núcleo pirenaico; e os
condados catalães.
Nessa imprecisão política, aparece com frequência o nome
da Galiza, ora como reino, ora como condado. Seu limite ia até o curso do rio
Douro, mas dentro dele havia outros territórios governados por condes que
dependiam do reino de Leão.
Nos primeiros anos
da Reconquista, a importância da região galega aumentou ao se descobrir em 813
o túmulo do Apóstolo Santiago em Compostela, que se tornou o patrono da
Reconquista cristã. Segundo Monteagudo (1999, p. 97-98), no final do século XI
e durante o século XII, no mundo cristão houve uma retomada da religiosidade:
com um auge de peregrinações, bem como a organização das primeiras Cruzadas
contra aos “infiéis”. Nesse contexto, por sua vez, o mosteiro de Cluny liderou
o movimento de reforma na vida religiosa católica.
Daí, com o fortalecimento do clero galego cuja sede é em
Lugo, Santiago de Compostela tornou-se o terceiro maior ponto de peregrinação,
posição conservada até hoje, somente perdendo em importância para Jerusalém e
Roma.
Por influência de Cluny, o caminho original à Santiago
foi ampliado até o reino dos francos tornando-se conhecido como a rota
francesa, que no século XI foi reformada para atender a demanda de peregrinos,
conforme Mapas
.
Em muitos dos antigos territórios cristãos, os Caminhos
de Santiago de Compostela, que em sua maioria retomavam as vias romanas,
ajudaram a formar grande parte dos fenômenos de imigração e transformação da
colonização cristã desde o século XI até o século XIII. Pode-se lembrar também
a importância, até o século XIV, da rota portuguesa a Santiago, partindo das
Cidades: do Porto, Braga e Coimbra (posteriormente prolongado até o Algarve),
na manutenção dos territórios bem como da língua e cultura galego portuguesas
nos novos territórios.
Segundo Monteagudo desde meados do século XII, na Galiza
começou-se uma grande reestruturação rural e urbana, concomitantemente na
Catalunha, graças a numerosas cartas que outorgavam terras a condes, que
favoreciam o renascimento urbano e acolhiam imigrantes, peregrinos,
comerciantes e membros dos exércitos.
Esse modelo de colonização colocava os falares românicos
sobre o árabe, e a reforma de Cluny retomava o latim no âmbito religioso,
espalhando-os com a reconquista, pela Península Ibérica. Segundo Bassetto no
avanço rumo ao sul, a reconquista encontrava populações moçárabes, mais ou
menos arabizadas, mas que haviam conservado, pelo menos em parte, seus falares
românicos, agora associados à fé cristã. Dessa forma, os falares românicos
passaram a designar a identidade de um povo.
Apesar do Mapa fornecer uma visão conjunta das conquistas
cristãs sobre os territórios muçulmanos, o processo não foi tão unificado. Por
volta do ano 800, Castela era apenas um condado de Astúrias e, posteriormente,
de Leão. Em 1029, Sancho II, rei de Navarra herdou Castela e depois dividiu o
seu reino em três: Aragão, Navarra e Castela. Com Fernando I (1035-1065) o
reino de Castela se uniu ao de Leão, que em conjunto com Berenguer I de
Barcelona passaram a cobrar impostos dos reinos Taifas. Com Alfonso VI de
Castela e Leão (1065-1109) houve a anexação de Toledo em 1085 e o reino Taifa,
com el Cid como herói.
No reinado de Alfonso VII (1126-1157), Castela tornou-se
o centro cristão, enquanto Aragão e a Catalunha se uniram a Berenguer IV desde
1137 e o condado de Portugal tornou-se independente desde 1139 com Afonso
Henriques. Enquanto Alfonso VII completava o domínio do rio Tejo (1147), Afonso
I de Portugal tomava Lisboa (1147) e Berenguer IV conquistava Tortosa, Lérida e
Fraga. Com a morte de Alfonso VII, Leão e Castela separaram-se até 1230. Na
segunda metade do século XII, as alianças e guerras entre cristãos e os
reforços muçulmanos frearam parcialmente a reconquista, obrigando os cristãos a
reorganizarem seus exércitos.
Em 1212, Alfonso VIII de Castela conquistou Tolosa.
Portugal, depois do tratado de Sabugal (1231) com Castela e Leão sobre a
expansão, conquistou o Alentejo em 1232 e o Algarve em 1239, já definindo,
praticamente, suas atuais fronteiras.
Em 1230, com
Fernando III, os reinos de Castela e Leão uniram-se fortalecendo e aumentando o
poder político. Nesse período, com o enfraquecimento dos reinos muçulmanos, a
reconquista avançou em direção a Valência, Ilhas Baleares e Múrcia, com Jaime I
de Aragão, em 1238; e com Fernando III conquistou Córdoba, Jaén e Sevilha em
1248.
No período de 1262
a 1263, Alfonso X (1252-1284), rei de Castela, incorporou as serras da baixa
Andaluzia, conquistou Cádiz e Niebla em 1264, e expulsou quase todos os muçulmanos
da Andaluzia cristã.
Com ajuda de Jaime
I, completou o domínio de Múrcia. Entretanto, as circunstâncias políticas e
econômicas para completar a colonização puseram um fim no avanço da reconquista
no final do século XIII, conforme os Mapas .
A capacidade defensiva do reino de Granada ao receber
apoio entre 1275 e 1350, fez com que resistisse até 1492, quando a força
militar da união dos reinos de Castela e Aragão, com Isabel e Fernando, o
anexou.
Dessa maneira, cada falar românico foi-se desenvolvendo
de acordo com o prestígio político de seu reino e sua importância dentro do
contexto da reconquista cristã. Segundo Bassetto (2001, p. 235), até meados do
século XI, o castelhano era apenas o falar da região de los castillos, Castela,
que convivia com outros falares provenientes do latim. Durante o reinado de
Alfonso X, século XII, o castelhano já era a língua oficial do reino de Castela
e Leão, ainda que outros falares também fossem usados nos seus devidos contextos.
Segundo Menéndez
Pidal a força política que o reino de Castela veio a exercer sobre a Península
teve um papel fundamental na definição de seus falares. Para o autor, Castela
cresceu politicamente anexando os reinos a sua volta e estendeu o seu domínio
político e linguístico “em forma de cunha”, em direção ao sul. Assim, a força
política do castelhano não deixou que outro falar se desenvolvesse, apenas em
suas periferias o galego e o catalão o conseguiram diante da sua forte presença,
ao passo que impediu o leonês e o aragonês, sem, contudo, conter o euskera.
O
português, no entanto, por representar um reino forte e independente,
desenvolveu-se e irradiou-se desde seu centro cultural, para as regiões que
foram conquistadas por Portugal, e, posteriormente, pelas regiões de além-mar
dos descobrimentos. Pode-se notar que a divisão dos reinos cristãos no século
XIII, ilustrada no Mapa 19 é muito semelhante à divisão atual dos falares na
Península Ibérica (Mapa) atestando Menéndez Pidal (1968) e Bassetto (2001).
Bem Legal ... mas acho que seria IMPORTANTE vc acrescentar que esse estudo foi feito pelo CIRCULO FLUMINENSE DE ESTUDOS FILOLÓGICOS E LINGUISTICO .... http://usp.br/gmhp/publ/AreA4.pdf
ResponderEliminar